A mobilização estratégica da escrita: uma análise sobre a Gesta abbatum Lobiensium composta pelo abade Folcuíno (940-990)

 

 

The strategic mobilization of writing: an analysis of the

Gesta abbatum Lobiensium composed by abbot Folcuin (940-990)

 

 

 

 

Vitor Boldrini
Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Brasil

v.mboldrini@gmail.com

 

Resumen
 

Nos estudos atuais sobre os séculos X e XI, um dos principais procedimentos adotados pelos historiadores é a reconsideração crítica das fontes episcopais e monásticas. Elas são avaliadas, especialmente, tendo em vista os fatores que estimularam os processos de escrita e conservação. Por meio desta abordagem, é possível averiguar nos documentos as concepções de mundo dos clérigos, ou seja, os modos pelos quais eles representaram suas respectivas visões acerca da sociedade contemporânea. A produção dos textos, as maneiras de eles serem arquivados e os discursos mobilizados são aspectos vinculados às aspirações políticas de seus autores. Partindo destas premissas metodológicas, o presente trabalho proporá algumas reflexões sobre a Gesta abbatum Lobiensium, documento redigido pelo monge Folcuíno no final do século X, no qual foram sintetizados os atos e as sucessões dos abades do monastério beneditino de Lobbes. As razões do empreendimento da escrita, bem como a composição da narrativa, serão analisadas por intermédio de uma contextualização mais ampla, o que permitirá examinar o momento político vivenciado pela abadia e pelo seu autor.

 

Palabras clave: Escrita - Folcuíno - Lobbes - Narrativa

 

 

Summary

In the current studies on the 10th and 11th centuries, one of the main procedures adopted by historians is the critical reconsideration of episcopal and monastic sources. They are evaluated, especially, in view of the factors that stimulated the writing and conservation processes. Through this approach, it is possible to ascertain in the documents the clerics' worldviews, that is, the ways in which they represented their respective views on contemporary society. The production of the sources, the ways in which they are archived and the discourses mobilized are aspects linked to the political aspirations of each author. Based on these methodological premises, the present work will propose some reflections on the Gesta abbatum Lobiensium, a document written by the monk Folcuin at the end of the 10th century, in which the acts and successions of the abbots of the benedictine monastery of Lobbes were synthesized. The reasons for the undertaking of writing, as well as the composition of the narrative, will be analyzed through a broader contextualization, which will allow to examine the political moment experienced by the abbey and its author.

 

Keywords: Writing - Folcuin - Lobbes - Narrative

 

 

Recibido: 08/01/2021

Aceptado: 08/07/2021

 

 

Nas primeiras décadas subsequentes à Segunda Guerra Mundial, muitos dos historiadores que se dedicavam ao estudo dos séculos X e XI, e que eram vinculados à tradição acadêmica francesa, tinham como objetivo central apontar e explicar as transformações supostamente radicais das estruturas sociais e políticas ocorridas a partir da dissolução do Império Carolíngio, que teriam culminado na posterior consolidação de um novo modelo de sociedade, a dita “Sociedade Feudal” (Mazel, 2008). Em linhas gerais, essa tese defende que teria havido uma decomposição dos poderes públicos e o enfraquecimento de autoridades, como os reis e condes, que, durante os séculos VII e IX, concentravam prerrogativas fiscais, jurídicas e militares. Como resultado, teriam surgido os castelães, um novo grupo político que usurpou tais atribuições para o exercício do poder privado num novo quadro de dominação local, o senhorio banal (Bertrand et al., 2008).[1] 

 Esse modelo explicativo começou a ser questionado por alguns trabalhos publicados na década de 1990 (Barthélemy, 1993 e 1997), que propuseram novas formas de analisar as fontes do período. Os historiadores defensores do paradigma da “Mutação Feudal” utilizaram elementos descritos na documentação de origem essencialmente eclesiástica como evidências de profundas transformações sociais. As pesquisas nos últimos anos, por outro lado, propõem reavaliar esses textos, interpretados não tanto enquanto expressões plenas da realidade social, mas indícios das concepções de mundo de seus respectivos autores. Na prática, isso significa que, ao extrairmos informações dos documentos para o trabalho historiográfico, é fundamental que investiguemos antes o contexto no qual eles foram redigidos e a situação particular de seus escritores (Nieus; Ruffini-Ronzani, 2011). Nesse sentido, sabendo que as fontes que dispomos para estudar os séculos X e XI foram produzidas principalmente por bispos e monges em centros episcopais e monásticos, devemos abordá-las sem negligenciar a relação entre os discursos eclesiásticos e as práticas sociais (Lauwers, 2008: 15-18).

 Um dos resultados dessas reconsiderações acerca da análise crítica dos documentos é a ampliação, nos últimos anos, de pesquisas dedicadas ao estudo das práticas sociais da escrita durante o período medieval (Chastang, 2006). São investigadas as condições nas quais os textos foram compostos, bem como os seus modos de arquivamento. Assim, os trabalhos pioneiros de medievalistas anglo-saxões (Moore, 1987) (Geary, 1994), acompanhados das pesquisas de outros historiadores alemães e italianos,[2] analisaram os meandros existentes nos processos de escrita, demonstrando que eles estavam conectados com usos pragmáticos no presente (McKitterick, 2004).

 No caso dos documentos redigidos por clérigos entre os séculos IX e XI, eles são interpretados a partir da gestão da memória arquivística em seu conjunto (Morelle, 2000). Para os monges, a escrita foi um instrumento muito importante: as fontes, quando por eles reunidas, eram uma tentativa de melhor sintetizar aquilo que definia a identidade de mosteiros e da comunidade monástica como um todo (Declercq, 2000). Ao fazerem isso, eles utilizaram os textos com o objetivo de constituir leituras sobre o passado e o presente de estabelecimentos, moldando assim contornos mais claros da memória coletiva nessas instituições (Caby, 2003).

 Um gênero textual bastante elucidativo do incremento da função arquivística de documentos são os cartulários, que podem ser definidos como coletâneas de cópias de cartas que retém a memória jurídica, instrumentalizadas na gestão administrativa (Bertrand, 2009: 5). O uso e a conservação cada vez mais recorrentes deste tipo de texto em comunidades religiosas a partir do século X são explicados por circunstâncias políticas e sociais, como restaurações, conflitos com autoridades locais ou regionais e concorrências eclesiásticas, que estimularam os clérigos a redefinirem suas respectivas identidades (Morelle, 1998).

 Além dos cartulários, outro gênero textual que começa a ser mais difundido no mesmo período são as Gestae. Em linhas gerais, estes documentos estabelecem os atos e as sucessões de abades ou de bispos de monastérios e bispados, respectivamente (Sot, 1981). Muitos dos estudos recentes que trabalham com essas fontes destacam que, para compreendermos as razões que impulsionaram suas produções, é necessário examinar as disputas ideológicas e políticas nas quais cada um dos seus autores estava envolvido no momento contemporâneo à escrita.

 A análise feita a respeito de Gerardo I, o bispo de Cambrai entre 1012 e 1051, demonstra a conexão existente entre a atividade literária no bispado e a restauração de sua autoridade episcopal (Jégou, 2004). A Gesta episcoporum Cameracensium, composta pelo capelão Folques sob supervisão de Gerardo, manifesta o caráter sacralizado da linhagem episcopal de Cambrai, que se perpetuava por intermédio da transmissão do capital de santidade acumulado a cada sucessão de um novo bispo (Jégou, 2004: 51). De acordo com o autor do estudo mencionado, Gerardo teria sacralizado nessa narrativa a função episcopal ocupada, se apresentando como o legítimo herdeiro do bispado, um argumento discursivo para reivindicar o prestígio de seu ofício no local (Jégou, 2004: 52) Outras Gestae foram lidas a partir de perspectivas semelhantes: elas reverberam os temas mais caros aos que estiveram envolvidos na produção, sendo instrumentalizadas, então, de acordo com questões políticas pragmáticas (Schlochtermeyer, 1998).

 Por outro lado, sabemos que as Gestae, fontes muito complexas (Vanderputten, 2001: 152), não eram meras ferramentas empregadas diante das reconfigurações das relações de poder. Deste modo, elas não devem ser abordadas levando em conta tão somente o contexto social e político no momento presente da escrita.  Por compilarem informações e arquivos, as Gestae eram também obras de referência que visavam alcançar audiências futuras, estando, portanto, sujeitas a reinterpretações quando utilizadas em diferentes contextos (Riches, 2007).

 O breve panorama historiográfico sobre alguns aspectos da sociedade medieval nos séculos X e XI, esboçado aqui de forma não exaustiva, expressa que uma das preocupações centrais dos pesquisadores nas últimas três décadas é reavaliar criticamente as fontes episcopais e monásticas. Em diálogo com tais perspectivas, o presente trabalho buscará estabelecer interpretações e hipóteses acerca da Gesta abbatum Lobiensium, documento escrito pelo monge e abade de Lobbes Folcuíno, entre 968 e 980.[3] Para tanto, serão discutidos determinados elementos que influenciaram a constituição narrativa da fonte, como é o caso das visões do autor acerca dos valores e princípios que deveriam ditar o funcionamento da sociedade contemporânea. Por meio desse olhar, defenderemos que a maneira do texto ter sido desenvolvido está diretamente conectada com a afirmação de Lobbes enquanto uma instituição religiosa importante do fim do século X na região de Liège, bem como a consolidação da autoridade abacial de Folcuíno frente à comunidade monástica.

 

Folcuíno e Lobbes: alguns elementos factuais

 

Indivíduo de ascendência nobre carolíngia, já que seu pai era descendente direto de Carlos Martel, o avô de Carlos Magno (Dierkens, 2013: 287), Folcuíno nasceu por volta de 940 (Dolbeau, 1984: 423) na região da Lotaríngia (ver imagem I abaixo):

 

Imagem I

                    

http://connaitrelawallonie.wallonie.be/fr/histoire/atlas/la-scission-de-la-lotharingie-959

 

Ele recebeu formação monástica no mosteiro beneditino de Saint-Bertin, situado no Condado de Flandre, onde foi oferecido oblato[4] pelos seus pais, em 948. No tempo em que permaneceu nesta comunidade, Folcuíno foi responsável por engendrar considerável produção literária, lidando com a preservação de documentos e a constituição dos arquivos locais.[5] Pela reputação de ser um homem culto e letrado, adepto de uma vida beneditina regular e estrita, e ainda pelo prestígio que sua família gozava na região da Lotaríngia, ele foi nomeado em 965 pelo bispo Eráclio abade do monastério de Lobbes, situado a aproximadamente 100 quilômetros a oeste da sede episcopal de Liège (Dierkens, 1985:120).

 Esta abadia, cuja data de fundação remonta a meados do século VII durante o período merovíngio, estivera sob tutela dos reis carolíngios durante boa parte do século IX: além das doações recebidas, muitos dos abades eram laicos por eles designados (Dierkens, 1985:129-130). Em 887, Lobbes foi cedida em benefício real aos bispos de Liège, que passaram a exercer, simultaneamente, a função abacial. Ainda que a incorporação da Lotaríngia ao Sacro Império Romano Germânico, em 925, tivesse trazido certa estabilidade à comunidade monástica (Isaïa; et al., 2009: 87), uma revolta foi desencadeada pela aristocracia local, 29 anos depois.

 Gisleberto (890-939), antigo Duque da Lotaríngia, havia confrontado até a sua morte, em vão, as ambições do Imperador Germânico Otão I (912-973), que visava controlar a região (Reuter, 1992: 152). Porém, em 954, seu sobrinho, Reginaldo III, motivado pelos mesmos objetivos do tio, liderou uma rebelião a favor da maior autonomia da Lotaríngia (Dierkens, 2013:281). Uma das consequências desse evento foi a expulsão do então abade de Lobbes e bispo de Liège, Ratério, que havia sido nomeado um ano antes pelo arcebispo de Colônia, Bruno, irmão de Otão I (Oediger, 1961: 123). Designado novo bispo de Liège pelos grupos que comandaram a conspiração, Balderico, ao contrário de seus predecessores, não acumulou o cargo de abade de Lobbes, nomeando Erluíno para esta função.

 Mesmo com o afastamento definitivo dos revoltosos (Reginaldo foi condenado ao exílio em 958 e Balderico morreu no ano seguinte) e a retomada da influência otoniana na região (Eráclio, um antigo aluno de Ratério, foi conduzido ao bispado de Liège pelo mencionado Bruno de Colônia), persistiu a separação de funções entre o abade de Lobbes e o bispo de Liège. Assim, embora mantivesse um forte vínculo institucional com este bispado, o monastério passou a contar com um abade regular, isto é, que não mais acumulasse outros cargos eclesiásticos, cujas atividades estivessem concentradas, exclusivamente, em favor da comunidade monástica. Nesse sentido, Eráclio, em 960, designou Aletrão como abade de Lobbes, e, após a morte deste, Folcuíno, em 965.[6]

 O abaciado dele foi marcado, inicialmente, pelo conflito travado com o seu padrinho,[7] o já mencionado antigo bispo de Liège Ratério, que, após ser expulso da sede episcopal de Verona, retornou à Lotaríngia em 968 para reivindicar seu antigo cargo de abade em Lobbes, o que obteve dois anos depois mediante o uso da força, sem, no entanto, se consolidar. A disputa perdurou até 973, quando Notger, o novo bispo de Liège, mediou a querela e destituiu Ratério, que permaneceu em definitivo na cella de Aulne, uma dependência de Lobbes, onde faleceu no ano seguinte (Dierkens, 2013: 283). Folcuíno, por sua vez, foi restabelecido no comando do monastério, e continuou nessa função até sua morte, em 990.

 Ao longo dos anos subsequentes ao fim do conflito, Lobbes, de acordo com a documentação diplomática da época, obteve alguns privilégios e a sua sucessão de abades se tornou mais estável. Por exemplo, após a restituição de Folcuíno, o Imperador Germânico, Otão II, confirmou a imunidade do monastério por intermédio de um ato imperial:

 

[...] nós mesmos concedemos à abadia, por este preceito da autoridade imperial, bem como ao benevolente Cristo, os cenóbios restantes, e os consentimentos referentes à nossa proteção, para que a própria [a abadia], também se beneficie da defesa sob a perpétua imunidade. (Sickel, 1879-1884:63).[8]

 

Numa bula de 990, o papa João XV também destacou que Lobbes, um monastério estreitamente vinculado ao bispado de Liège, era um espaço religioso muito importante, reiterando a referida proteção imperial:

 

[...] nós confirmamos, pela mesma proteção da nossa imunidade, para que o abade, que é sempre nomeado entre os monges, seja assim escolhido entre eles, embora o bispo de Liège seja o responsável por designá-lo aos mesmos [...] (Zimmermann, 1984: 592).[9]

 

Essa contextualização mais ampla que estabelece alguns dados factuais[10] é fundamental na interpretação da Gesta, obra que deve ser analisada à luz desses acontecimentos mais recentes da abadia, já que foi redigida entre 968 e 980. O documento, assim, é contemporâneo à querela entre Folcuíno e Ratério, e sua composição é indissociável do contexto político e dos últimos eventos do passado de Lobbes, o que nos leva a indagar sobre os projetos e as ideias que o então abade tinha para o seu monastério.

 

A interpretação de Folcuíno sobre a abadia de Lobbes na Gesta abbatum Lobiensium

 

Redigida em 29 capítulos dispostos, de modo geral, em ordem cronológica,[11] a fonte elenca os atos e as sucessões dos abades de Lobbes, desde o período do seu fundador no século VII, o beato Landelin, até o momento presente da escrita, ou seja, o abaciado do próprio Folcuíno. Consideramos que a forma do texto ser composto e a narrativa desencadeada não foram fortuitas: nos trechos selecionados que serão analisados a seguir, fica claro que o autor visou defender e expressar valores em conformidade com as suas aspirações sociais e políticas particulares. Estas, inclusive, estavam diretamente conectadas com o desenvolvimento e a organização presente do monastério.

 No prólogo, Folcuíno defende a articulação dos reinos no mundo terreno com a responsabilidade intrínseca que eles carregam de manifestar e difundir as virtudes e os valores da Igreja Cristã. Por essa razão que o autor cita apenas muito brevemente a sucessão de alguns reinos que precederam o nascimento de Cristo, como o dos assírios e o dos persas. Ainda que estivessem sob controle de Deus, que tinha o poder de alterá-los quando quisesse, eles não eram guiados pelos ensinamentos do Cristianismo, e, por isso, foram mencionados de modo sucinto na Gesta. Neste quadro, o passado e as sucessões de eventos desses reinos “não são tanto para se admirar” (Pertz, 1841: 55).[12] Ele se atenta mais detidamente ao evocar o Reino Franco, que, a partir da conversão de Clóvis, se tornou um Reino Cristão, incorporando a proteção da Igreja e o respeito aos ensinamentos de Deus:

 

[...] os formidáveis Francos, que ocuparam finalmente a Gália e as partes restantes dos locais, modificaram a idolatria para a aprendizagem em Cristo. Então o rei deles, Clóvis, se tornou adepto ao Batismo pela graça de Cristo por intermédio de Santo Remígio, e converteu seu povo ao Cristianismo. Cristo, o rei dos reis, não difundiu a prática de presentear os combatentes; mas ele os conduziu aos reinos, expandindo rumo aos seguintes sucessos. A partir de Clóvis, Clotário e Dagoberto, a sucessão do Reino Franco permaneceu abençoada e hereditária. E por que a enorme sabedoria de Deus não deveria permanecer, que diz: “os reis governam por minha causa”, firmando a fé, consolidando a justiça e a igualdade? Atestam este bispado [Liège] e os monastérios, que, destruídos ou inexistentes antes desse tempo, a partir de então, estando restaurados, se expandiram, e começaram com novos auspícios. (Pertz, 1841:55).[13]

 

Para explicarmos esse discurso, é muito importante relacionar a história do desenvolvimento do monastério de Lobbes com a atuação dos reis francos. Esta abadia, ao longo dos séculos VII e IX, estivera estreitamente articulada com os merovíngios e os carolíngios, já que estes se envolveram na sua fundação e consagração, e ainda foram os responsáveis pela concessão de diversos benefícios e privilégios (Dierkens, 1985). Dada esta importância dos soberanos francos na expansão de Lobbes, notamos que eles ocupam um lugar de destaque no texto: nos capítulos seguintes, há uma valorização das interferências destes reis em proveito do monastério, com ênfase em algumas doações e restituições. Assim, a retórica do Reino Cristão, assinalada no trecho acima, estava muito vinculada a um reino, no âmbito secular, que fosse capaz de assegurar o desenvolvimento específico da abadia de Lobbes.

 No segundo capítulo, Folcuíno pontua que um dos primeiros abades e fundadores do monastério, o beato Ursmar, foi diretamente beneficiado pelas medidas tomadas por Pepino de Herstal, um dos prefeitos de palácio[14] mais proeminentes do século VII:

 

[...] Lá onde um certo tempo o ilustre beato Ursmar, virtuoso em todos os exercícios, a quem o Senhor Apóstolo havia delegado o monastério de Lobbes, ele foi logo evocado pelo príncipe Pepino de Herstal. Ele recebeu o mesmo monastério para ser governado através da intervenção de Hildolfo, que era um dos mais proeminentes príncipes do reino. [...] (Pertz, 1841: 56).[15]

 

O mesmo Ursmar foi responsável pela consagração da Igreja Abacial de São Pedro, e Folcuíno teve o cuidado em datar com precisão este evento, destacando, mais uma vez, o soberano franco temporalmente correspondente:

 

Então [Ursmar], no começo de seu controle sob a Igreja Abacial, que antes desse tempo ainda não havia sido consagrada, ele enfim a consagrou, dedicando-a ao Senhor pela honra do príncipe dos apóstolos Pedro, e ao mesmo tempo do catequista do povo Paulo, e de todos os apóstolos de Cristo; acumulando no templo e no altar presentes e múltiplas proteções dos santos. Essa consagração ocorreu no ano 697 da Reencarnação do Senhor, no dia 26 de agosto, reinando o Senhor Deus perpetuamente, e governando Pepino, por outro lado, os Francos. (Pertz, 1841: 57).[16]

 

As descrições das sucessões de muitos dos abades foram acompanhadas, várias vezes, da menção aos reis francos contemporâneos: nesse modo de datação, além de eles constituírem um importante ponto de referência cronológica, as suas nomeações e práticas estavam a par dos eventos e do desenvolvimento de Lobbes. Assim, Folcuíno indica que, após a morte do abade Teodolfo, em 776, Anson é nomeado seu sucessor, “governando o mesmo monastério durante 24 anos no tempo do Imperador Carlos Magno” (Pertz, 1841: 59).[17] No registro das três sucessões consecutivas após a morte deste mesmo Anson, permanece a menção aos reis coetâneos:

 

Depois dele [Anson], o canônico Hilderico usurpou a mesma abadia no tempo do mesmo Imperador [Carlos Magno]. E depois dele veio Ranerico, já no tempo do Senhor Imperador Luís, O Piedoso. Em seguida, chegou o piedosíssimo senhor abade Folrado, tio materno do já mencionado Ranerico, ainda no tempo do mesmo Imperador [Luís]. (Pertz, 1841: 59).[18]

 

A centralidade dos reis carolíngios na narrativa se deve, também, aos bens temporais por eles estipulados para Lobbes.[19] Por esse motivo que Folcuíno cita, no capítulo 13, alguns acontecimentos do monastério no século IX, mencionando os que estiveram neles envolvidos, como o Rei Lotário II:

 

Ora, em seguida, pela atuação do Rei Lotário II, neto do dito Imperador Luís, o Piedoso, o mesmo local [Lobbes] começou a ser reparado/renovado, e tanto as possessões, quanto os habitantes, foram restaurados não mediocremente pelo bispo de Cambrai João e por um certo Hugo, e pela ordem do mesmo rei. (Pertz, 1841: 61).[20]

 

As múltiplas divisões do Império Carolíngio, ao longo do século IX, marcam um ponto de inflexão na narrativa. Se até o capítulo 14 o autor destaca que a prosperidade da Igreja Cristã e, consequentemente, de Lobbes, vão de par com as realizações dos reis francos, as crises de sucessões e o enfraquecimento das autoridades destes significaram que a paz eclesiástica havia sido conturbada” (Pertz, 1841: 62).[21] Nesse sentido, diante de uma “sucessão que se mostra deficitária” (Pertz, 1841: 61),[22] o monastério, indefeso, teria sido abalado pelas invasões normandas, por destruições e saques:

 

O local foi assim destruído pelos Normandos, embora permanecessem nele, a custo, as ruínas dos muros. De forma semelhante, as propriedades restantes da nossa Igreja, que em Brabante eram extravagantes, nesse tempo foram esvaziadas e esgotadas (Pertz, 1841: 62).[23]

 

As datações dos atos dos abades se tornaram menos precisas. Se antes Folcuíno marcava, com clareza, o período exato de cada abaciado, relacionando com o rei franco correspondente, a fragmentação do poder dos imperadores carolíngios, a partir do final do século IX, fez com que ele abandonasse tal forma de registro do tempo (van Renswoude, 2006: 332). Por meio dessa alteração, Folcuíno expressa que a passagem da administração de Lobbes do rei para o bispo de Liège teria resultado em instabilidade, de modo que, para ele, não seria mais possível indicar os contornos precisos dos atos de cada abade, tampouco apontar qual seria o soberano correspondente. Ao tratar dos conflitos desencadeados no início do século X pelo bispado de Liège, o autor expressa, na sua narrativa, o que seria a perda da exatidão das definições das autoridades políticas envolvidas com o monastério:

 

Tendo Estevão sido enterrado na Igreja de São Lamberto após a sua morte, a Igreja estava novamente perturbada em razão da sucessão do bispo de Liège. De um lado, Hilduíno, clérigo da mesma Igreja, desejava ser bispo, tendo o apoio do Duque da Lotaríngia, Gisleberto, que, tomando a majestade régia, tinha usurpado para si o topo do reino; de outro, o abade de Prüm, Ricário, desejado pelo dom e com acordo do rei Carlos, o Simples. Evidentemente que Carlos, como é dito, tornado rei no interregno dos interregnos de alguns reis, foi evocado, consagrado e restituído como o rei paternal pelo arcebispo de Reims, Fulquério. [...] (Pertz, 1841: 63).[24]

 

O início da restituição do que seria, para o autor, a paz eclesiástica ideal, só ocorreu com a ascensão dos imperadores do Sacro Império Romano Germânico, em especial a partir do reinado de Otão I. As virtudes de Cristo e as vontades de Deus que, como assinalado no prólogo, deveriam acompanhar a administração no mundo terreno, seriam elementos restaurados somente com a recomposição da autoridade imperial, mais de meio século após a fragmentação do poder político dos carolíngios:

 

Otão, então poderosíssimo rei austral, governava também a subjugada Itália; seu irmão, Bruno, terá a única e singular glória futura na Igreja de Cristo, bem como a preciosíssima lápide dos filósofos, que tinha muito poder, segundo suas múltiplas evidências. [...] O modo como [Otão] viveu, foi instruído, aquilo ele que fez, a maneira com que ele acordou a si próprio pela paz das Igrejas de Deus, sendo que as Igrejas hão de ser o mais possível ampliadas ou restauradas, os edifícios privados e públicos hão de ser construídos em maior número possível, os serviços da casa hão de ser os mais ordenados possíveis, a mudança terá sido realizada o mais possível em função das coisas da Santa Igreja de Deus, tudo o que é feito é admirável, louvável de dizer (Pertz, 1841: 64).[25]

 

A mobilização de um discurso que evoca o restabelecimento da paz da Igreja de Cristo é uma retórica, como anteriormente citado, que está estreitamente conectada com a estabilidade e a prosperidade da abadia de Lobbes. Com efeito, a partir de meados do século X, as invasões húngaras, que haviam causado destruições ao monastério, são combatidas por Otão. Junto com os seus irmãos, ele garantiu que a paz eclesiástica “fosse completamente acordada” (Pertz, 1841: 67),[26] de modo que Deus, tal como no momento da Criação, também estivesse “em paz, em prol da salvação do seu povo” (Pertz, 1841: 67).[27] Em resumo, Otão, atuando enquanto protetor de Lobbes, é descrito por Folcuíno como um Imperador que, ao encarnar as vontades de Deus e as virtudes indispensável de um Rei Cristão, incorporou funções outrora reservadas aos carolíngios:

 

[...] O gloriosíssimo triunfo do Imperador [Otão] sobre o próprio rei dos bárbaros, os duques e príncipes, os capturados; as numerosas vitórias por toda extensão daquele reino, até o final/até a expulsão da mesma família [dos húngaros]. Essas coisas todas são particulares, e expressam a aplicação do seu trabalho pelo louvor e pela glória do onipotente Deus (Pertz, 1841: 67).[28]

 

O fato de Folcuíno ter se colocado na narrativa em prol dos soberanos que defenderam os patrimônios de Lobbes expressa que ele estava, acima de tudo, empenhado em interceder em favor do monastério do qual era abade. Isso nos conduz a outro ponto fundamental, essencial na análise da fonte: o autor buscou marcar com maior precisão os bens e as propriedades que pertenciam e definiam a identidade da comunidade monástica. Nesse sentido, a Gesta contribuiu na construção de uma memória não apenas em relação ao passado e às sucessões dos abades, mas também sobre os arquivos de Lobbes.

 Ao longo da narrativa, embora não haja transcrições completas de cartas de doações,[29] é patente o zelo de Folcuíno em buscar o registro por escrito do histórico de movimentação dos bens fundiários. Na época carolíngia, por exemplo, o autor pontua algumas transferências que foram concedidas no período, ainda que ele próprio reconheça não ser possível determinar com detalhes aquilo que foi acordado:  

 

[...] Carlos Magno governara o Reino Franco não preguiçosamente, e o expandira não mediocremente. Com efeito, no tempo dele, muitas propriedades foram trazidas à nossa Igreja, que deveriam ter sido registradas, se não fossem doações e cartas legatárias ao alcance de todos. Pela brevidade das informações apresentadas, eu mesmo não poderia me aplicar ao registro delas [...] (Pertz, 1841: 59).[30]

 

Além de fazer menção aos bens que foram trazidos a Lobbes pelo Rei Lotário II, Folcuíno também destaca, particularmente, o modo como essas informações foram gravadas e registradas:

 

Então, no décimo quarto ano de seu reino [de Lotário II, por volta de 867], ele ordenou que fossem descritas as doações [redditus] das nossas vilas, que se chamam políptico. E essa descrição foi realizada pelo referido bispo João [de Cambrai] (Pertz, 1841: 61).[31]

 

Especialmente no que se refere aos eventos mais recentes do passado do monastério, isto é, aqueles ocorridos durante o abaciado de Folcuíno, é possível notar que o autor, por intermédio da Gesta, constituiu uma narrativa que pudesse destacar as evoluções contemporâneas de Lobbes. Ao fazer isso, ele visou demonstrar que a abadia, sob sua governança, não era mais instável, em contraponto às décadas anteriores, e tampouco se envolvia em disputas tensas, como aquela desencadeada com seu padrinho Ratério em 974, abordada anteriormente. Pelo contrário, ele compôs um discurso que marcasse que o seu abaciado, juntamente com a ascensão do bispo Notger, de Liège, teria representado inovação, prosperidade e, finalmente, a tão almejada estabilidade da Igreja de Cristo:

 

Tendo sido restabelecida a nossa sólida paz pela graça de Deus através do agente Notger, o senhor bispo de Liége retorna, e no tempo restante inova e decora os templos, multiplicando as coisas eclesiásticas consumidas. Então, nós verdadeiramente confessamos, nenhum dos seus predecessores, por aquilo que é recordado, aumentou tanto as coisas da Igreja de Liège e fez notabilizar os edifícios como ele. Naquele tempo, alguns edifícios em nosso monastério se desenvolveram a partir do impulso do bispo, obra feita para o abade [o próprio Folcuíno] (Pertz, 1841: 70).[32]

 

Ao tratar do momento em que fora nomeado abade de Lobbes pelos bispos Eráclio e Igrano, em 965, Folcuíno teve a cautela em modelar na Gesta um retrato muito positivo das condições que possibilitaram sua ascensão no monastério. Além de ter contado com os supostos consentimentos do Imperador Germânico e da comunidade monástica, ele teria sido designado para a abadia no mesmo dia do nascimento de Cristo. Está aqui presente uma estratégia discursiva, pois o autor fez questão de coincidir na fonte o evento de sua nomeação com uma data importantíssima de celebração do calendário litúrgico (van Renswoude, 2006: 324), cunhando, assim, uma narrativa que fosse capaz de legitimar e sacralizar perante a comunidade monástica, tanto a sua função abacial, quanto o seu prestígio pessoal:

 

Depois este senhor Eráclio designou como abade de Lobbes Folcuíno, verdadeiramente pecador, jovem; que é quem o mesmo bispo de Colônia Bruno fez ser apontado diante da presença imperial, com anuência de grande parte da população, e, anteriormente, pela selecionada e recitada escolha dos irmãos [comunidade monástica]. Ele foi nomeado, pois, pelo bispo Igrano de Cambrai, no mesmo dia do nascimento do Senhor [25 de dezembro]. Portanto, tendo regressado e adquirido o posto de abade, ele agiu dispondo de numerosas liberdades de ação; onde a prosperidade foi servida a abadia em muitas oportunidades (Pertz: 1841: 69).[33]

 

Por fim, com relação aos bens materiais da abadia descritos no último capítulo da Gesta, Folcuíno procurou deixar claro que muitos dos objetos litúrgicos presentes no cotidiano da comunidade monástica no período de escrita do texto (978-990), bem como outras riquezas, pertencem de fato a Lobbes, e foram incorporados, sobretudo, em virtude das ações executadas por este abade e pelo bispo Notger:

 

O refeitório, estando muito elegante, teve sua construção finalizada. Ele foi fundado e concedido a Deus. Na entrada, Notger fez um vestíbulo, no qual projetou um ducto subterrâneo para a passagem de água [...]. Então o refeitório foi consagrado pelo senhor bispo com velas [...] A Igreja de São Paulo, que os húngaros haviam incendiado, ele recuperou, a qual anexou a casa dos enfermos [...]. A Igreja fora restaurada com os ornamentos mais elegantes, o que fez com que ela se tornasse belíssima. A mesa do altar, que era insignificante, Notger tornou-a prateada; ele decorou a mesma casa do altar e o teto desta (Pertz, 1841: 70).[34]

 

Buscando se inserir na memória litúrgica dos monges, Folcuíno seria, portanto, o responsável direto, junto com o bispo de Liège, por assegurar a continuidade regular dos ofícios monásticos. Para encerrar a narrativa, ele cita a construção de dois sinos, que simbolizariam o engajamento perpétuo e ininterrupto do monastério a serviço de Deus, iniciado durante o seu abaciado: 

 

E Notger fez dois grandes sinos, um dos quais, que era o maior, dedicou-o a São Pedro, e o outro, a São Ursmar. E no verso desse primeiro está escrito o seguinte: “A mão artística de Daniel me estabelece pela ordem de Folcuíno, para que eu exalte em favor da Santíssima Trindade”. E no outro apenas isso: “Folcuino, em nome de Deus e de seu protetor São Ursmar” (Pertz, 1841: 71).[35]

 

A redação da Gesta abbatum Lobiensium e o modo de sua narrativa ter sido concebida se devem a diversos fatores inter-relacionados. Em primeiro lugar, o documento buscou organizar com maior clareza o histórico de doações e privilégios concedidos ao longo das sucessões de abades, bem como registrar alguns bens que pertenceriam a Lobbes, especialmente aqueles mais importantes na sua definição no momento presente da escrita. O texto, assim, síntese da história e dos arquivos monásticos, foi concebido para melhor consolidar a identidade institucional da abadia.

 Composto logo após períodos de turbulências, ele visava pontuar, em segundo lugar, que o monastério, sob Folcuíno, seria, a partir de então, um lugar de poder estável, cujas propriedades estariam bem estabelecidas. Portanto, o autor criou uma narrativa que pudesse constituir uma memória favorável à sua função como abade, de modo que ele fosse visto como o clérigo que finalmente trouxe paz e prestígio a Lobbes, depois das disputas e das consequentes instabilidades nos últimos anos. Para tanto, a retórica da paz eclesiástica cumpriu um papel fundamental: Folcuíno enalteceu especialmente os reis carolíngios e os imperadores germânicos, indivíduos que, assim como ele, estariam empenhados no cumprimento das virtudes cristãs, traduzidas por proteção aos interesses específicos da comunidade monástica lobiana.

 Finalmente, sabemos que a Gesta abbatum Lobiensium poderia ser um instrumento de legitimação, ou seja, uma ferramenta escrita para que os abades pudessem reivindicar seus direitos particulares e as suas respectivas autoridades sobre o local. Nesse sentido, a fonte não foi redigida apenas em função dos interesses políticos pessoais de Folcuíno, inseridos no contexto do final do século X. Obra de referência, ela também seria deixada para a posteridade, sujeita a alterações e acréscimos de informações relativas aos atos e às sucessões dos futuros abades. Com efeito, um monge de Lobbes em 1162 retomou o trabalho de Folcuíno, se comprometendo a registrar os principais eventos da história lobiana ocorridos a partir de 980, ano em que o primeiro autor havia concluído suas intervenções. Essa complementação foi intitulada Gesta abbatum Lobbiensium continuata (Berkans, 1993), que cobriu os atos dos abades até, aproximadamente, 1159.[36]

 

 

Considerações finais

 

Os textos redigidos por clérigos entre os séculos X e XI são fontes valiosíssimas na compreensão dos modos pelos quais monges e bispos reagiram e se posicionaram de forma ativa diante das relações sociais do período. Quando nos detemos na relação entre os discursos eclesiásticos presentes nos documentos e as práticas sociais de seus respectivos autores, é possível investigar suas maneiras particulares de representar o mundo e dar sentido à sociedade na qual estavam inseridos.

 Assim, notamos que Folcuíno não escreveu a sua Gesta motivado somente por aspectos ligados ao ofício monástico. Ele tampouco visou elencar as sucessões de abades de modo imparcial: na realidade, os trechos selecionados deixam claro que a produção do documento estava conectada estreitamente com o momento político contemporâneo de Lobbes. Deste modo, Folcuíno e a sua comunidade monástica não estavam separados da esfera temporal, embora a Regra de São Bento, ao longo do século X, tenha buscado “subtrair a Igreja de sua inserção no século” (Bertrand, 2008: 135). Portanto, nossa análise defende que a interpretação da Gesta deve extrapolar o mero valor litúrgico deste texto: sua composição e os artifícios empregados na narrativa testemunham as estratégias sociais de Folcuíno.

 Conforme salientamos, o valor do documento não pode ser reduzido a um instrumento pragmático utilizado pelo autor diante de suas lutas políticas do presente. Dado que a fonte constituía uma espécie de catálogo da biblioteca do monastério (Vanderputten, 2004: 81), ela poderia ser consultada não apenas pelos monges locais, inseridos no contexto do final do século X, mas estaria acessível também a audiências futuras, incluindo os abades subsequentes. Ainda assim, foi possível pontuar como Folcuíno, ao recorrer a um trabalho histórico em proveito da definição da abadia de Lobbes como um espaço de poder particular, buscou também reiterar seu prestígio enquanto abade, consolidando sua autoridade sobre o local e, simultaneamente, assegurando um papel de influência e de destaque na sociedade senhorial do século X.

 

 

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Este artigo apresenta alguns resultados preliminares de um projeto de pesquisa de mestrado sob financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Processo Fapesp nº 2019/21692-4) orientado pela Profª. Drª. Néri de Barros Almeida, docente vinculada ao Departamento de História do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas (IFCH/UNICAMP), e coordenadora do Laboratório de Estudos Medievais (LEME) - Núcleo UNICAMP.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


[1] É preciso mencionar que os autores citados acima não defenderam essa explicação. Em seus textos, eles compuseram um balanço crítico amplo acerca da referida interpretação.

[2] Perspectiva sintetizada em alguns artigos muito esclarecedores de Michel Lauwers (2003, 2009).

[3] Todas as fontes citadas ao longo deste artigo são traduções próprias de edições em latim para o português. Os respectivos textos originais foram incluídos nas notas de rodapé.

[4] A Oblação Beneditina é um processo através do qual um cristão laico filia-se a uma família monástica de sua escolha, por um laço de ordem espiritual, a fim de poder, em virtude desta filiação, participar dos bens espirituais desta comunidade.

[5] O documento de Folcuíno mais conhecido em Saint-Bertin é a Gesta abbatum Sithiensium, uma combinação de textos hagiográficos e diplomáticos, associados a reflexões historiográficas e a considerações sociopolíticas. Os estudos de Nicolas Mazeure, Laurent Morelle, Karine Ugé e Steven Vanderputten pontuam, em linhas gerais, a importância da fonte para a melhor gestão dos arquivos do monastério e para a criação de uma memória útil sobre o passado, que melhor definisse a identidade monástica frente a um contexto político instável.

[6] Sobre a história monástica de Lobbes, incluindo as sucessões abaciais, o supracitado livro de Alain Dierkens, publicado em 1985, oferece elementos primordiais, como a lista de abades entre as páginas 129 e 131.

[7] Graças aos diversos estudos de François Dolbeau sobre a vida e as obras de Ratério, sabemos que Folcuíno era, de fato, seu afilhado.

[8] “[...] concessimus eidem abbatiae per hoc preceptum auctoritatis imperatoriae ut, sicut Christo propitio reliqua coenobia sub nostra constituta tuitione, ipsa quoque gaudeat defensione sub perpetua emunitate”.

[9] “[...] sub eadem immunitatis nostrae tuitione confirmamus, ita ut a monachis semper incolatur et abbatem de suis habeant, quem tamen episcopus Leodiensis eis praefecerit [...]”.

[10] As informações aqui reunidas sobre Folcuíno e a abadia de Lobbes foram extraídas, principalmente, da riquíssima produção bibliográfica de Alain Dierkens, que se ocupa em compreender, sobretudo, o fenômeno de implementação do Cristianismo nas regiões banhadas pelos rios Mosa e Sambre entre os meados dos séculos VII e XI.

[11] Embora a Gesta contenha, no total, 44 capítulos, a narrativa sobre os atos e as sucessões dos abades de Lobbes se encerra no capítulo 29, e é com este recorte que trabalharemos nas páginas seguintes. Alguns dos 15 capítulos restantes, dedicados principalmente aos milagres do Santo Ursmar, foram posteriormente compilados, pelo próprio Folcuíno, em um dossiê hagiográfico particular, a Miracula Ursmari (Dierkens, 1983:252).

[12] “De regnorum quoque successionibus seu permutationibus, quas vel audivimus vel vidimus, non multum mirandum”.

[13] “[...] ferocitatem Franci sortiti sunt nomen; qui Gallias demum ocupantes, et ceteris id locorum formidabiles, ydolagiam in Christi tyrocinium commutaverunt. Nam rex eourum Clodoveus per sanctum Remigium Christi gratiam baptismate adeptus, gentem suam christianam effecit. Nec distulit rex regum Christus donavitum dare sibi militantibus; nam provexit eos regnis, auxit successibus secundis. Inde ad Clodoveos, Clotharios, et Dagobertos felix illa et hereditaria permansit successio. Et quare non maneret, quam sapientia Dei, quae ait: Per me reges regnant, fide firmabat, aequitate et iustitia roborabat? Testantur hoc episcopia vel monasteria ante id temporis diruta aut nulla, quae abhinc aut rediviva pullularunt aut novis auspiciis inchoarunt”.

[14] Os prefeitos de palácio eram, durante o período merovíngio, os mais importantes dignitários do Reino Franco, atrás apenas do próprio rei. Pepino de Herstal, por exemplo, era o prefeito de palácio da região da Austrásia, que corresponde, aproximadamente, às fronteiras atuais entre a Bélgica e a França. Ele era o pai de Carlos Martel, e, portanto, pertencia à linhagem dos carolíngios, dinastia que passou a designar os reis francos a partir do final do século VIII. 

[15] “[...] beatus Usmarus virtutum exercitiis omnibus clarus, cui Lobbias apostolatus locum delegaverat Dominus, a Pippino iam dicto principe evocatus, idem monasterium regendum accepit per Hyldulphi interventum, qui erat unus de proceribus regni maioribus”.

[16] “Igitur in exordio regiminis sui (697) ecclesiam, quae ante id temporis erat inconsecrata, consecravit, dedicans illam Domino in honore principis apostolorum Petri, simulque doctoris gentium Pauli, et omnium apostolorum Christi; cumulans templum donis et altare multiplicibus sanctorum patrociniis. Facta est autem haec dedicatio anno qui est sexcentesimus nonagesimus septimus dominicae incarnationis, septimo Kalendas Septembris, Domino in perpetuum regnante, Pippino autem in Francis principante".

[17] “[...] regens idem coenobium sub iam dicto imperatore Carolo viginti quatuor annis”.

[18] “Post eum eandem abbatiam usurpavit Hildricus canonicus sub ipso imperatore. Et post eum Ramnericus tempore domni Ludovici imperatoris. Deinde pervenit ad domnum Folradum, piissimum abbatem, avunculum iam dicti Ramnerici, sub eodem imperatore”.

[19] Detalharemos melhor esse ponto mais adiante no texto.

[20] Iam vero postea a Lothario rege, filio iam dicti imperatoris Lotharii, coepit idem locus reparari et per Iohannem Cameracensem episcopum vel Hugonem quendam tam possessionibus quam et habitatoribus per eiusdem regis iussum non mediocriter redintegrari.

[21] “Tali ergo modo turbata ecclesiae pace”.

[22] “[...] deficiente successione”.

[23] “Qui locus a Northmannis ita destructus est, ut remanerent in eo vix maceriarum ruinae. Similiter et cetera ecclesiae nostrae predia, quae apud Brabantum erant profusiora, hoc tempore exhausta sunt et exinanita”.

[24] “Isto quoque mortuo et in ecclesia sancti Lamberti sepulto (920), turbatur rursus ecclesia de antistite substituendo. Nam pars una Hilduinum, eiusdem ecclesiae clericum sibi poscebat episcopum, favente sibi ad hoc Gisleberto Lothariensi duce, qui floccipendens regiam maiestatem, regni sibi usurpaverat summam; alia Richarium Prumiae abbatem, dono et consensu Caroli regis expetitum. Qui videlicet Carolus, facto, ut dictum est, interregno regum quorundam interregnantium, a Fulcone archiepiscopo Remis evocatus et consecratus paternoque regno est restitutus”.

[25] “Ottho, tunc potentissimus rex australis, et subactae Italiae tunc imperitabat; cuius frater Bruno unicum et singulare in Christi ecclesia decus futurum, velut pretiosissimus lapis multiplicibus philosophorum pollebat argumentis. [...] Ubi quomodo vixerit, quomodo docuerit, vel quid fecerit, qualiter pro pace ecclesiarum Dei se ipsum impenderit, quam in ecclesiis sive ampliandis sive restaurandis, quam in privatis et publicis aedificiis componendis, quam in ordinandis domi militiaeque, quam sanctae Dei ecclesiae rebus sollicitus fuerit, actu est admirabile, dictu laudabile”.

[26] “[...] ecclesiae pax in placito regali confirmata”.

[27] “[...] pacis, tanquam eius inicio operatus est salutem in populo suo”.

[28] “[...] gloriosissimum imperatoris triumphum, regem ipsum barbarorum, duces et principes captivos, trophaea per totam regni illius latitudinem usque ad eiusdem gentis fines frequentissima, quae omnia proprii industriam operis ad laudem et gloriam omnipotentis Dei exspectant”.

[29] Na Gesta abbatum Sithinesium, que Folcuíno escreveu quando era oblato no monastério de Saint-Bertin, a narrativa das sucessões dos abades era alternada com documentos diplomáticos, que atestavam as doações, os privilégios e as proteções concedidos à Saint-Bertin. Na Gesta abbatum Lobiensium, por outro lado, salvo raríssimas exceções, predomina uma narrativa com o mesmo fio condutor, sem grandes interrupções, do início ao fim.

[30] “[...] sub Carolo rege post vero imperatore; regens illud non segniter et augmentans non mediocriter. Sub eius enim tempore multa ecclesiae nostrae praedia collata sunt, quae describerentur, si non in promptu essent donationes, et cartae legatariae, et ipse brevitati non studerem [...]”.

[31] “Quarto decimo igitur regni sui anno redditus villarum nostrarum describere iussit, quod polipticum vocant. Facta est autem haec descriptio a Iohanne episcopo praenominato”.

[32] “Pace nobis per Dei gratiam Nothgero agente firmissima collata, domnus episcopus Leodium revertitur, reliquum tempus in innovandis sive decorandis aedibus et ecclesiasticis rebus multiplicandis consumens. Nam, ut verum fateamur, nullus praedecessorum suorum, quantum recordatur opinio, illo amplius Leodiensem ecclesiam rebus auxit, aedificiis nobilitavit. Creverunt illo tempore et in monasterio nostro aedificia nonnulla, instinctu episcopi, opera abbatis facta”.

[33] “Post haec domnus Evracrus Folcuinum, vere peccatorem, aetate iuvenem, Laubiensibus praefecit abbatem; quem, cum esset idem pontifex Coloniae in praesentia imperiali, in frequentia magna populari, recitata prius et lecta fratrum e lectione, ibidem ordinari fecit. Ordinatus est ergo ab Ingranno Cameracensi episcopo die ipso Domini natalicio. Inde reversus, et loco potitus, plura suo arbitratu egit; unde et fortuna in plurimis eam servire fecit”.

[34] “Refectorium a fundamento coeptum, et Deo concedente satis elegans perfectum. In cuius introitu fecit vestibulum, in quo per subterraneos meatus aquae ductum fecit [...] Quod refectorium a domno Tiedone episcopo consecratum est [...]. Ecclesiam sancti Pauli, quam Hungari incenderant, retexit, cui domum infirmorum annexit. [...] Ecclesia quia per se satis elegans erat, ut in ornamentis elegantior redderetur operam dedit; quam de pulchra fecit pulcherrimam. Cuius altaris tabulam, quia nulla erat, fecit argenteam; domum ipsam altaris et laquear ipsius apprime pinxit”.

[35] “Fecit et campanas duas maiores, quarum unam, quae maxima erat, sancto Petro, et aliam sancto Ursmaro dedit. In ista versus hii inscripti sunt: Iussu Fulcuini me condidit artificis manus Danielis, ad laudem Triadis. In alia istud tantummodo: Fulcuinus Deo et patrono suo sancto Ursmaro”.

[36] Pouco se sabe sobre a autoria deste texto. O monge que o redigiu não se identifica, escrevendo, portanto, de forma anônima. Tampouco está claro se havia relação direta entre a composição da fonte e possíveis interferências de Francon II, o abade contemporâneo à escrita. Esta hipótese, todavia, parece bem plausível.